sábado, 21 de abril de 2012

Nomes


Muito provavelmente você nunca ouviu falar na dona Ceiça. Ela tem por volta dos 50 anos, morena, baiana, mora na zona leste de São Paulo e vende trufas deliciosas em frente uma universidade, também localizada nessa região. Dona Ceiça tinha uma filha que morreu antes de atingir a adolescência. Mas o passado de lembranças amargas não tirou o seu belo sorriso. A vida a apunhalou, porém, não lhe roubou a ternura. 

E também o seu José, que vende cachorro quente e mais um monte de guloseimas num carrinho de lanches no centro de uma cidade, na Grande São Paulo. Seu José trabalha mais de 12 horas por dia e faz um sanduíche que você come em menos de 20 minutos e paga uns poucos trocados. Há mais de 30 anos, por falta de opção, seu José atua ali. É quase uma vida. 

Lúcia, Gertrudes, Fábia, Manoel, Laerte, Jorge, João, Felipe, Romualdo, Karina, Joana, Helena, Ronaldo, Celina, Cecília, Jonas, Gleice, Mirtes, Josias, Wendel... 

Puxa, você também não deve conhecer a dona Josefa! Viúva, mãe de três filhos crescidos, casados, preocupados com o trabalho e as finanças... Dona Josefa caminha todos os dias de manhã, faz hidroginástica e claro, tricota à beça com as comadres durante os exercícios de aeróbica com o professor japonês, o Carlos.  Ela tem mais disposição que muito jovenzinho por aí. 

Você sabe do Alfredo? Alfredo é um morador de rua. Tem barba branca, usa uma jaqueta abotoada, uma calça moleton e um chinelo havaianas branco, de fivela azul claro. Alfredo domina o inglês, adora ler e é engajado em causas sociais - aliás, ainda lhe devo um café. Conheci Alfredo durante os movimentos do “Acampa Sampa”, no começo deste ano. Nessa época, sua "casa" era a Praça do Ciclista, na Paulista.

Maria, Antônio, Fátima, Armando, Ana, Paulo, Márcia, Carla, Patrícia, Bruna, Fernando, Anderson, Cleiton, Cláudio, Pedro, Almiro, Valdir...

Tenho certeza que jamais ouvir falar na dona Rita. Ela vivia sozinha numa casa de dois cômodos em um bairro de uma cidade da Grande São Paulo. Dona Rita nunca foi ao médico, ela fazia seus próprios remédios. Não tinha televisão, só um rádio de pilha dos ano 90. Ela andava com um véu branco, que escondia os seus cabelos prateados. Quando viajou pela primeira vez de avião rumo a Pernambuco, terra de sua família, morreu assim que chegou lá. 

Ou Geraldo, usuário de crack. Geraldo já foi empresário, talvez rico. Gastava uma fortuna com drogas. Vive nas ruas de São Paulo, sob o olhar do preconceito. Tem vergonha de voltar para sua família, mas tem família. Tem vergonha de si mesmo. Tem vergonha da vergonha que sentem dele. Geraldo é vítima, e não vilão.

Ivan, Carlos, Santos, Sidney, Charlene, Marlene, Cássia, Roberta, Rosana, Palmira, Vagner, Sandra, Marta, Ricardo, Marcos, Genilson, Kleber...

... eu e você.